Isto Dizem que finjo ou minto Tudo que escrevo. Não. Eu simplesmente sinto Com a imaginação. Não uso o coração. Tudo o que sonho ou passo, O que me falha ou finda, É como que um terraço Sobre outra coisa ainda. Essa coisa é que é linda. Por isso escrevo em meio Do que não está ao pé, Livre do meu enleio, Sério do que não é. Sentir? Sinta quem lê! Fernando Pessoa
domingo, 30 de dezembro de 2012
segunda-feira, 24 de dezembro de 2012
domingo, 23 de dezembro de 2012
segunda-feira, 12 de novembro de 2012
quarta-feira, 17 de outubro de 2012
Por um poema
Há
coisas que apenas se sentem, são indizíveis
na
distância que a palavra não alcança
perdida
nos mil dias, nas flores de Maio
por
um poema
por
uma história que não era minha
como
não é o voo dos pássaros
nem
a paz dos rios.
Minhas,
só tenho a vida e a morte
e
algumas palavras... doces e amargas.
Por
um poema
estou imperdoavelmente triste.
MariaJB
quinta-feira, 20 de setembro de 2012
...
Foi o
teu sorriso assim de madrugada
Neste porque sim ou porque não
Morro assim… desta maneira…
MariaJB
Que no
rumor do vento me beijou
No
êxtase da íntima noite, abraçada
À tua
a minha alma chorou
E
quando sorris assim quero morrer
Celebrar
a Deus e à luz dourada
Este
vício de te amar de tanto querer
A
minha alma viva e apaixonada
Neste porque sim ou porque não
Neste
instante fugaz de prazer
De
desejo, de vinho e de paixão
Morro assim… desta maneira…
E
não…não tenho medo de morrer...
Porque
teria se a alma se faz inteira?
MariaJB
segunda-feira, 17 de setembro de 2012
Baudelaire
De uma
planície de papel e pontas de lápis gastos
Entre
o descaso e a melancolia de todas as palavras extintas
vens
tu do silêncio
no
enlevo das flores malditas
e não
sei se essa loucura me liberta ou escraviza,
[Se o
poema endurece ou humaniza]
Poeta,
Mas se
não mata, cura.
MariaJB
sábado, 15 de setembro de 2012
Adolescência
Tenho saudade
daquele tempo
de vida despreocupada
em que tudo é nada
mas intenso cada
momento
sonhado
com a inocência do
pensamento
de ser mais… querer
mais…
da irreverência da
adolescência
de dizer sim ao não
na afirmação de quem
cresce
e acredita que na vida
tudo de bom se merece
MariaJB
domingo, 26 de agosto de 2012
Feliz? Sei lá...
Feliz?
Sei lá...
talvez
precise de umas sapatilhas de bailarina,
de um
sonho infantil,
da lua
que pedi e ninguém pôde dar
ou das
tulipas que não recebi, negras...
talvez
precise da surpresa,
do
espanto,
do
grito prodigioso da paixão,
de uma
fada que me leve na estrada encantada
para
além do tempo absurdo da solidão,
de
jardins aos molhos e sorrisos aos montes,
de
crença,
talvez
precise de uma espiga de ouro em campo de seara,
pode
até ser solitária,
o doce
engano de um raio de sol
ou
mesmo nada....
Feliz?
Sei lá!...
talvez
precise de "ôtros negoço possive".
MariaJB
Poema inspirado
no poema "Cante lá que eu canto cá" da autoria de
Patativa do Assaré (1909-2002).
Poeta de uma sensibilidade e simplicidade
extraordinárias foi com certeza um homem de grande sabedoria e que
acredito ter sido feliz.
Obrigada a quem me o deu a conhecer.
segunda-feira, 20 de agosto de 2012
Recuso-me
De
repente leva a esperança
o
espesso vento da melancolia
leva-a
para o mundo da descrença
do
esquecimento, da nostalgia
mas recuso-me a ser triste, a dar
à
morte a alegria fenecida
de um
pedaço de mim ainda em vida
recuso-me
a sofrer, a lamentar
o fado que me perturba e agita
que me
encurrala e confunde
recuso-me
à morte que artificia
a morte da alma que ainda acredita
num
mistério que abrande
o
espesso vento da melancolia
MariaJB
segunda-feira, 6 de agosto de 2012
....
Com o coração frio
saíste para fazer pátria
não te atrasaste
saíste com o silêncio
nas horas vivas pela madrugada
no teu ventre mãe o pequeno rapaz
Hiroshima, nosso horror
sem a alegria que prende ao infinito
os momentos breves e doces
a paz
na noite cruzaste mares e céus
e o que fizeste, meu Deus?
nada!
fizeste nada,
reduziste a criança a bomba, sangue e pó
como uma borboleta inflamada
em ondas de fogo para sempre,
eternamente.
E quase ninguém se atrasou
para a morte anunciada.
MariaJB
quarta-feira, 1 de agosto de 2012
Se soubesse escrever poesia
Se soubesse escrever poesia
Num só poema então te diria,
Baixinho… como são poderosas
As palavras…são como rosas
Provocantes nos matagais
São pétalas rubras fatais
Como beijos de surpresa e mel
No meu sorriso, na minha pele
São doces as pétalas proibidas…
Ai Deus…! É a ti ,que quase acredito,
que digo, eu sei porque são interditas
São o desassossego que me alarma
Invadem a minha mente e o meu espirito
E sussurram, baixinho… Dás-me a tua alma?
MariaJB
sexta-feira, 27 de julho de 2012
Mar
Inquieto e desconcertado
revolto e encrespado
de ondas pungentes
que morrem suavemente
e suavemente
na areia deixam versos perolados
de sentimentos inacabados
Ó mar! O que procuras?
A saudade?
Saudade é tempestade
é ansia sofrida
de dores não esquecidas.
Na imensidão desse aquário que é o mar
procura a bonança
porque quem procura sempre alcança,
e suavemente, suavemente
entende que a força do mar
que és tu
é a força que lhe queres dar
revolto e encrespado
de ondas pungentes
que morrem suavemente
e suavemente
na areia deixam versos perolados
de sentimentos inacabados
Ó mar! O que procuras?
A saudade?
Saudade é tempestade
é ansia sofrida
de dores não esquecidas.
Na imensidão desse aquário que é o mar
procura a bonança
porque quem procura sempre alcança,
e suavemente, suavemente
entende que a força do mar
que és tu
é a força que lhe queres dar
MariaJB
segunda-feira, 16 de julho de 2012
A selvagem esperança
Verdi
Éramos deuses e fizeram-nos escravos.
Éramos filhos do sol e consolaram-nos com medalhas de lata.
Éramos poetas e puseram-nos a recitar uma esmolinha por amor
De Deus.
Éramos felizes e civilizaram-nos.
Quem refrescará a memória da tribo.
Quem fará reviver os nossos deuses.
Que a selvagem esperança seja sempre tua,
querida alma indomável.
sábado, 14 de julho de 2012
Destino
Quem me dera poder
rasgar as asas do vento
sentar-me na nuvem branca
que passa no momento
e ao infinito gritar, gritar
que raio de destino é este
que me faz sonhar?
Só posso rir e chorar
Vejo o sol que brilha
e a lua que dança
na espera contida
da maldita esperança.
Que loucura! Cai na real
o mundo não pára
o vento sopra
a nuvem desliza
o sol brilha
e a lua não dança,
Tem quatro fases.
rasgar as asas do vento
sentar-me na nuvem branca
que passa no momento
e ao infinito gritar, gritar
que raio de destino é este
que me faz sonhar?
Só posso rir e chorar
Vejo o sol que brilha
e a lua que dança
na espera contida
da maldita esperança.
Que loucura! Cai na real
o mundo não pára
o vento sopra
a nuvem desliza
o sol brilha
e a lua não dança,
Tem quatro fases.
O meu primeiro poema.
MariaJB
quarta-feira, 11 de julho de 2012
Vae Victis
Triste, eu, do teu querer desmerecida
Por quanta e tanta, tanta mísera dor,
A minha num mistério de candor
De espinhos e rosas incandescidas
Escorre na minha alma sangue e ardor
De vermelho em chaga e as feridas
Furiosas são estrelas esplêndidas,
Puras, virginais cicatrizes de amor
Catedrais de luz e mágoas suspensas
Esplendorosas que a saudade adensa.
O meu frágil corpo grita desejo e vida
À face incerta de um novo sentimento,
Que me leve no riso um luminoso vento
Assim triste…mas não vencida.
MariaJB
domingo, 8 de julho de 2012
Quisera ser...
Quisera ser a esfinge do deserto
Guardiã das areias eternas
De tempos, sonhos e quimeras
Das fantasias onde desperto
Num espaço além universo
De noites brancas e gloriosas
Onde as sombras são rosas
E as tristezas são versos
Na minha alma gravados
De mistérios e segredos…
Ah! Tão estranha sorte
Esta…ser só o horizonte
misterioso e distante
Linha frágil de vida e morteMariaJB
quinta-feira, 5 de julho de 2012
Inês ou a Solidão
Na tempestade de um tempo maldito
Extingue-se o sol, o calor, o coração aflito
Ouve-se o uivo do chacal, o uivo da fera
No vazio idêntico da solidão que se apodera
Do espírito e da alma como um punhal
Fere o seio, o peito, o colo de graça fatal
Silencia na cova comida até ao pó,
Até à inerte substância de criatura só,
O choro e o riso do poder grandioso
Do despudor de um amor poderoso
A sete palmos da terra… são rainhas sim!
Dos imensos invernos, da imensa miséria
De estrelas, de sóis, de luas de quem sorria
Pelo crime de tanto…tanto amar assim…
MariaJB
quarta-feira, 4 de julho de 2012
....
Um anjo resplandeceu nas ruínas
Com um gesto que anima a frieza das estátuas
E os homens como crianças
Choraram verde, choraram esperança
MariaJB
segunda-feira, 2 de julho de 2012
A palavra exacta
Nunca gostei de física e matemática
de fórmulas e leis das ciências exactas
que até Deus fazem chorar.
Confesso que nunca as compreendi
talvez se deva a pouca inteligência,
sempre preferi o erotismo dos números,
os momentos de gala nos traços de Dali,
o gorjeio do tigre em noites de festim,
ou os miados dos pássaros ao luar,
e a palavra,
sempre preferi a palavra, simples assim,
e hoje pergunto com que inocência
se a palavra também mata?
Talvez o vento que hasteia o coração
Me ofereça a palavra exacta
aquela que significa perdão.
MariaJB
sábado, 16 de junho de 2012
As árvores também choram, irmão
As árvores também choram, irmão,
Acariciadas pelo vento as folhas que rodopiam
Num bailado de Isadora,
Serenas e sublimes de beleza calva e crua
Também elas contam uma história de outrora.
Na morte lenta do Outono a esperança nua
de reconciliação, de um sorriso na tristeza que pressentia
A leveza indizível do espírito nas asas de um anjo,
A inevitável separação de todos os ausentes.
Não te vou dizer
Como sofri ao ver-te morrer
E como ainda sofro
Todos os dias
tão longe e tão perto de ti.
A tua voz muda as nossas almas unia
De céu e espanto
E nunca a palavra foi tão plena no silêncio
Das mãos entrelaçadas.
MariaJB
quinta-feira, 14 de junho de 2012
...
Magnifico e poderoso
Ergues-te no porto da minha alma
Sem medo e arrojado
Confundes os deuses
O imenso poder das ondas vivas,
Repentinas, sobre os teus pés
De bronze fundido quebradas.
És um colosso
Espelho do sol que te presta tributo
Sem penas, sem luto.
MariaJB
sábado, 9 de junho de 2012
....
Heil Hitler! tocavam as concertinas do aprendizado mental…
… e os cães esfaimados e nervosos,
farejavam esperança e terror,
as estrelas brancas e puras.
Cada criança uma flor
à terra oferecida nas madrugadas nuas,
com que lágrimas,
com que dor?
MariaJB
domingo, 3 de junho de 2012
Mar passional
Mar que te cumpres onda após onda
E em cada uma ostentas um arco pujante
Uma abóboda branca que à terra oculta o horizonte
Tanta é a grandeza escandalosa de vida e morte
És luz e treva, água e sangue
E assim vens e vais continuamente
Passional
Nas asas de uma gaivota
Enquanto a terra chora fado e sorte
MariaJB
quinta-feira, 31 de maio de 2012
Ao Pescador
É difícil escolher as mais belas canções de sempre mas esta é sem dúvida uma delas.
Hoje é o Dia do Pescador, homem do mar, inspirador de grandes poetas, ainda assim atrevo-me a prestar-lhe homenagem com este poema.
As rugas nutridas de sol e sal falam de luta e de paixão
das noites, das luas e das marés
falam de ti, homem pescador
falam da tua fé
por esse mar
doce e sereno como o corpo depois do amor
pedes a Deus e à Virgem a dádiva de ir e voltar
a magia dos teus amores abraçar
pescador, no mar não és nada e és um homem e tanto
Com o sabor agridoce do prazer e da dor
noite após noite entras no mar
misterioso e enganador
quantas vezes general em guerra
de ondas e vendaval
quantas vezes o teu caixão
cruel e sem mágoa
quantas vezes te transforma em água
nas ondas da morte que vem fria e calma
quantas vezes voltas na espuma de encanto
de flores desfolhadas
na trovoada de raios e relâmpagos
São afagos, são lamentos,
a que Deus assiste
arrancados à alma
do teu amor triste
pelo infinito amar
e nem sabe se chora lágrimas
se chora mar
MariaJB
segunda-feira, 28 de maio de 2012
A mulher e o pássaro
Enquanto olhava o silêncio
Abruptamente cortado
Pelo concreto rumor do mar
Por uma pequena janela
Desenhada entre as ondas
Espreitava um pássaro dourado
De um tempo longínquo
No espelho do olhar gravado
Levou a mão ao peito
pulsava
Como a terra inundada
Que o mar surpreendeu
Pensava no destino
Até que lhe secou a pele
E o pássaro?
Desapareceu
MariaJB
sexta-feira, 25 de maio de 2012
Oscar Peterson
Oscar Peterson, grande pianista de Jazz canadiano na interpretação de Wave de Jobim.
Maravilhoso.
sexta-feira, 18 de maio de 2012
Os Amigos
Os amigos amei
despido de ternura
fatigada;
uns iam, outros vinham,
a nenhum perguntava
porque partia,
porque ficava;
era pouco o que tinha,
pouco o que dava,
mas também só queria
partilhar
a sede de alegria —
por mais amarga.
Eugénio de Andrade
despido de ternura
fatigada;
uns iam, outros vinham,
a nenhum perguntava
porque partia,
porque ficava;
era pouco o que tinha,
pouco o que dava,
mas também só queria
partilhar
a sede de alegria —
por mais amarga.
Eugénio de Andrade
Na minha alma...
Na minha alma...
murmúrios de sombras quentes
silhuetas negras em tela transparente
a melancolia da lua
sem luz não é minha nem tua
na minha alma…o sol que desvanece
lobos que uivam e nada acontece
em planícies de saudade
gritos de graffiti na indiferença da cidade
a revolta sem palco sem audiência
a liberdade apócrifa da minha existência
na minha alma…a agonia do touro em pontas de farpa
o pranto das árvores desnudas de folhas de prata
pétalas de rosa do deserto encontro e sempre perco
sonhos de areia cristalizada …é tudo e é nada…
MariaJB
terça-feira, 15 de maio de 2012
My Way
Versão original de Claude François com o título “Comme d’habitude” que Paul Anka adaptou, Sinatra imortalizou e Elvis sublimou. My Way.
segunda-feira, 14 de maio de 2012
Quis um dia...
Quis um dia querer-te com a ternura
De uma história delicadamente bela
Com sabor de hortelã menta e canela
Com sabor de mel e azul na noite pura
Quis um dia querer-te docemente
Como um mar de alva espuma
Quis querer-te leve como uma pluma
Acariciando o teu corpo suavemente
Mas quero-te como quem sente
Tão ferozmente …quero-te assim ...
De febre, de lava e fogo em mim…
E então, amor! Como querer-te docemente?
Se quero a labareda que me devore louca,
Se quero a fome e a chama da tua boca!
MariaJB
Conto
Tomado de tamanha excitação Zé Gato encostou a amada à parede “Ah José, agarra-te que vêm aí as curvas!”. Em momentos solenes usava o nome José, era mais finório. Zé Gato era o seu nome de menino quando agilmente corria pelas ruas e levava recados de porta em porta para arrecadar uns trocos e o fazia sentir-se homem. Mas o que ele gostava mesmo era de o associar aos momentos áureos em que se esgueirava e furtivamente roubava laranjas no quintal da vizinha Cristiana que de alma generosa fechava os olhos aos constantes ataques que vitimavam a aritmética do seu laranjal, e com o andar gingão e sobrolho levantado exibia o espólio de meia dúzia de citrinos aos pirralhos que o seguiam e idolatravam pela coragem e ousadia.
O que não estava nos planos de Zé Gato foi o súbito tremedor que lhe entrou pelas unhas dos pés e se encavalitou sem misericórdia pelo corpo acima. Habituado a façanhas de macho junto das mulheres de vida fácil sentiu-se repentinamente desajeitado sem saber como pôr as mãos nas curvas de Angélica já ofegante pela expectativa das carícias do garboso namorado. Roçou-lhe a masculinidade e sentiu a quentura voluptuosa daquele corpo que lhe oferecia a virtude sem resistência. Ainda timidamente em toques de veneração percebeu que amava perdidamente aquela mulher de belos olhos que lhe larapiou o coração. Com o olhar preso no dela inclinou o rosto e beijou-a gentilmente, uma vez, mas já ávido de paixão explorou todos os recantos daquela boca de mel e finalmente explodiu e libertou as mãos da inércia temporária percorrendo todo o corpo de Angélica derretido de amor e magia.
“Ah, grande malandro! Pensavas que me fintavas?“ Atarantado, ainda sem perceber bem o que lhe estava a acontecer Zé Gato acordou do sonho com uma paulada na cabeça acompanhada dos gritos estridentes de D. Prudência, a querida futura sogra, que tomada de cuidados os seguiu sorrateiramente na missão inabalável de guardiã da honra da família.
“Puta da velha!!” pensamento que traía o olhar inocente e desculposo que lhe dirigiu. Sempre era melhor prevenir não se desse o caso de tudo dar para o torto e então “adeus curvas!”. Com uma vontade assassina de esganar aquele pescoço flácido e rugoso compôs o semblante com o ar mais respeitoso e sóbrio possível sentindo o cacarejar do galo que emergia exuberante no alto da sua cabeça.
“D. Perpétua, vossemecê há-de desculpar o atrevimento, mas eu e a Angélica… bem… nós estamos noivos!”
Tal foi a novidade que até o Zé Gato ficou surpreendido de olhos esbugalhados a olhar para as duas mulheres.
Angélica, sem voz e corada até às orelhas, ajeitava nervosamente ao longo das pernas o vestido amarelo que tão amorosamente tinha costurado para a tão esperada noite do bailarico, estarrecida com o que acabava de ouvir e acontecer, suspensa pelo ar tenebroso da mãe Prudência.
“Noivos? “ pensou D. Prudência com o cérebro já a mil, afinal o rapazola não era desajeitado, tinha trabalho, nas obras pois bem mas quem sabe não viria a ser mestre e o futuro da sua Angélica estaria garantido.
“Disseste, estamos noivos?” perguntou ainda com um ar carrancudo.
“Bem…eu…” começou Zé Gato a gaguejar, rogando pragas a si próprio pela alhada em que se metera.
“Mau! És gago?” cortou D. Prudência já preparada para um novo ataque com o ar autoritário que se impunha, olhando para Angélica ainda meio apalermada com os olhos pregados no rosto magro e pálido do seu amado. Repentinamente como quem adivinha a falsa verdade irrompe num choro convulsivo deixando Zé Gato atrapalhado sem saber o que dizer “Estou frito” pensou desgostoso, que amava Angélica era um facto e agora ela esvaía-se em lágrimas como se o mundo estivesse para acabar. Não via necessidade de precipitar as coisas e ainda teria que explicar que a amava mas precisava dar um jeito à vida que já previa ser miserável no entanto ouviu-se a si próprio “ Angélica, queres casar comigo?” Ora, que se lixe, afinal era um homem de coração grande, bem podia acreditar que o amor por Angélica seria suficiente para matar a sede.
Mais tarde por via da desculpa enquanto se enfrascava para esquecer as agruras da vida de cão viria a pensar que foi este episódio traumático que lhe avivou os instintos violentos a juntar a umas quantas surras que o pai lhe distribuía gratuitamente quando ainda menino resolvia, por conta dos trocados, desviar uma mísera moedinha para rebuçados ao pecúlio tão ansiosamente aguardado pela garrafa de vinho que o pai despejava com desvelo enquanto lhe dizia as estranhas palavras “quando as curvas se transformam em praça não há remédio melhor que beber uma taça”.
MariaJB
terça-feira, 8 de maio de 2012
Um Amigo
Há uma casa no olhar
de um amigo.
Nela entramos sacudindo a chuva.
Deixamos no cabide o casaco
fumegando ainda dos incêndios do dia.
Nas fontes e nos jardins
das palavras que trazemos
o amigo ergue o cálice
e o verão
das sementes.
Então abre as janelas das mãos para que cantem
a claridade, a água
e as pontes da sua voz
onde dançam os mais árduos esplendores.
Um amigo somos nós, atravessando o olhar
e os véus de linho sobre o rosto da vida
nas tardes de relâmpagos e nos exílios,
onde a ira nómada da cidade arde
como um cego em busca de luz.
Eduardo Bettencourt Pinto
Para todos os meus amigos, aqueles para quem sou real ou imaginária. Não importa.
de um amigo.
Nela entramos sacudindo a chuva.
Deixamos no cabide o casaco
fumegando ainda dos incêndios do dia.
Nas fontes e nos jardins
das palavras que trazemos
o amigo ergue o cálice
e o verão
das sementes.
Então abre as janelas das mãos para que cantem
a claridade, a água
e as pontes da sua voz
onde dançam os mais árduos esplendores.
Um amigo somos nós, atravessando o olhar
e os véus de linho sobre o rosto da vida
nas tardes de relâmpagos e nos exílios,
onde a ira nómada da cidade arde
como um cego em busca de luz.
Eduardo Bettencourt Pinto
Para todos os meus amigos, aqueles para quem sou real ou imaginária. Não importa.
domingo, 6 de maio de 2012
Morte
Com esses dentinhos de crocodilo e olhos de serpente
és uma bruxa de beijo fatal e beijas toda a gente
tão amorosa…numa manhã qualquer ou tarde
ou noite reclamas o pão com que te alimentas e ardes
com que gemidos com que queixumes com que lamentos
danças e ris e gozas como um pássaro de rapina ao vento
ergues altares de devoção com flores sem caule, mortas
como gostas, e no silêncio uma égua a relinchar absorta
com que cavalos riscas o tempo e que drogas andas
a tomar? Grande turista de terra e mar e não te cansas
não te mói o trabalho comes o corpo e sorves a alma
ó Negra és um estado, uma nação de vermelho e calma
lambes o sangue, o plasma e os glóbulos, incansável
mãe da nova estirpe dos olhos vazios e abominável
creio que o teu problema deve ser falta de amizade!
ciúmes talvez… da vida, do prazer do riso, da possibilidade
Criatura bizarra! beijar a Humanidade é o teu plano…
por favor não me faças um like nos próximos 50 anos!
MariaJB
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